Eutopia. Revista de Desarrollo Económico Territorial N.° 16, diciembre 2019, pp. 31-50

Cercamentos: Imagens dos camponeses na contemporaneidade do Brasil
Enclosures: Images of peasants in contemporary Brazil

 

 

Maria Aparecida de Moraes Silva*, Lúcio Vasconcellos de Verçoza** y Tainá Reis de Souza***

* Professora Sênior do curso de Pós-graduação em Sociologia da Universidade Federal de São Carlos (Brasil), maria.amoraes44@gmail.com, orcid.org/0000-0002-0019-7806.

** Doutor em Sociologia pela Universidade Federal de São Carlos. Professor colaborador do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Federal de Alagoas (Brasil), luciovercoza@yahoo.com.br, orcid.org/0000-0003-2585-4267.

*** Doutora em Sociologia pela Universidade Federal de São Carlos (Brasil), tainareisz@gmail.com, orcid.org/0000-0003-4901-0448.

Recibido: 29/08/2019 • Aceptado: 29/10/2019 • Publicado: 20/12/2019
DOI: http://doi.org/10.17141/eutopia.16.2019.3865

Resumen

Este artículo analiza los efectos de la expansión del capitalismo agrario en algunas regiones de Brasil, dominadas por las plantaciones de caña de azúcar, soja, eucalipto y ganado. Proponemos una reflexión que va más allá de los aspectos económicos y políticos, considerando que este proceso, tal como sucedió y aún ocurre, se ha basado en la acumulación primitiva a través de la expropiación de tierras, incluidos los bienes comunes, y de las subjetividades de los campesinos, indígenas y quilombolas. El proceso de acumulación primitiva impuesto se caracteriza por la violencia, esclavitud y cercamiento de tierras y cuerpos. La discusión se centrará en la dialéctica conflictiva producida por el cercamiento. Miles de indígenas fueran víctimas de masacres y genocidios. La pérdida de condiciones objetivas produce cambios en las relaciones sociales de género, ya que los hombres se ven afectados por la movilidad y las mujeres por la inmovilidad. El control sobre los campesinos convertidos en mano de obra marca sus cuerpos con el timbre de cuerpos mecanizados, dominados por el sufrimiento. Las mujeres quedan en sus granjas rodeadas de plantaciones de agronegocios, relegadas al papel de la reproducción familiar. Los datos resultan de investigaciones empíricas, documentos, historias de vida y relatos orales. La inserción de la esfera reproductiva en el análisis de la acumulación primitiva trae nuevos elementos para la comprensión de las formas de explotación y de la resistencia.

Palabras clave: territorios; agronegocio; acumulación; expropiación; explotación; subjetividades; género; Brasil.

Abstract

In this text we aim to analyze the effects of the expansion of agrarian capitalism in some regions of Brazil, dominated by the planting of sugar cane, soya, eucalyptus and livestock. We propose a reflection that goes beyond the economic and political aspects, whereas this process as occurred and is occurring in primitive accumulation is founded through the expropriation of land - including the Commons goods - and also of the subjectivities of the peasants, such as small farmers, squatters, indigenous, quilombolas. fte process of primitive accumulation imposed is characterized by violence, enslavement and enclosure of the land and of the bodies. fte discussion will be focused on the conflictive dialectic produced by the enclosure. In relation to indigenous peoples, in many cases, there have been massacres and genocide. fte loss of objective conditions produces exchange in the social relations of gender, insofar as men are affected by mobility and women by immobility, both processes controlled by the logic of accumulation. fte control over the peasants turned into workforce prints them the stamp of mechanized bodies, dominated by suffering. With regard to women, they remain surrounded by plantations of agribusi- ness in small portions of land – plots - relegated to the role of family reproduction. For these reflections we rely on several investigations that prioritize documents, life stories and oral reports. fte insertion of the reproductive sphere in the analysis of primitive accumulation, which accompanies the development of these capitals, brings new elements to the understanding of the forms of exploration and also of resistance.

Key words: territory; agribusiness; accumulation; expropriation; exploration; subjectivities; genre; Brazil.

Os ranquenhos voltam das suas fazendas às cinco (…) Como todos os dias, nesse crepúsculo regressaram das suas pastagens. Deram com o Huiska cercado. O Huiska é um morro pelado que não esconde mineral, nem olho-d’água e tampouco tolera o mais ralo dos pastos. Para que cercá-lo? Com o seu colar de arame, o Huiska parecia uma vaca metida num curral. (…) Nessa noite, a Cerca dormiu no morro Huiska. Os pastores saíram, no dia seguinte, com a roupa respingada de risinhos. Quando voltaram a Cerca já tinha engolido sete quilômetros. (Manuel Scorza. Bom dia para os defuntos. São Paulo: Círculo do livro, s d, pp. 42-43).

Consideraciones preliminares

Brasil é considerado um dos maiores produtores de commodities do mundo 1.

Segundo dados do MAPA (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento), em 10 anos a produção das principais commodities terá um acréscimo substantivo. A produção de soja aumentará em 33,2%; do açúcar em 23%; do algodão em 27%; da carne bovina em 22%. A área plantada com cana aumentará em 18,5%; do algodão em 41,8%; da soja em 28,4% e da celulose terá a exportação aumentada em 36,4% 2.

Em 2017, o valor da produção agrícola atingiu R$ 540,3 bilhões, considerado o maior resultado dos últimos anos 3.

Os dados projetados para o período de uma década (2017/18-2027/28) demonstram a expansão e, necessariamente, a ocupação de novas áreas para sustentar esta gigantesca produção, voltada, sobretudo, para as exportações. No Brasil, predomina a ideologia, segunda a qual a ocupação de novas terras é feita em áreas vazias, não habitadas, cujos preços são baixos. Portanto, uma ideologia mascaradora da realidade, dado que, em geral, tais terras são ocupadas por camponeses, negros, indígenas e seus descendentes. Dada a enorme extensão territorial do país, muitas áreas são ainda consideradas terras devolutas, isso é, pertencentes ao Estado. Desde as primeiras décadas do século XX, o Estado brasileiro, independentemente, das formas de governo – autoritária ou democrática -, criou várias normativas para justificar a chamada expansão da fronteira agrícola, a partir do leste em direção ao oeste do país. Nos limites deste artigo, não é possível a abordagem do longo processo histórico de avanço do capitalismo nessas regiões, considerando ainda que o mesmo já foi tema de estudo de vários autores 4.

Seguindo os objetivos elencados, propomos uma reflexão sobre o denominado avanço da fronteira agrícola, utilizando a cerca como metáfora para a análise do processo de acumulação primitiva 5 que não corresponde apenas ao início do capitalismo, mas como elemento constitutivo que acompanha sua expansão até os dias atuais. Por outro lado, o cercamento será entendido como ora movente, ora visível, ora invisível, ora ofuscado, ora destruído. De todo modo, vivenciado por homens e mulheres atingidos por ele. Optamos por trabalhar com imagens de diferentes cercamento referentes a algumas regiões em alguns tempos históricos, a saber:

- cercamento das terras indígenas no oeste;

- cercamento das chapadas de camponeses no Vale do Jequitinhonha (MG);

- cercamento dos tabuleiros em Alagoas;

- cercamento dos corpos nos canaviais paulistas.

Primeira imagem. O cercamento das terras indígenas (1910-1988)

No momento atual, assistimos, diariamente, pelos meios de comunicações, às investidas contra os povos indígenas em diferentes estados do país. Investidas que visam, sobretudo, ao apossamento de suas terras, por meio da violência, levadas a cabo pelos mandantes de empresas madeireiras, garimpeiros, fazendeiros e mineradoras 6 . Pela Constituição Cidadã de 1988, os povos indígenas são considerados proprietários originários das terras que habitam. Esta Constituição pôs fim à lógica assimilacionista existente até então, por meio da qual, os indígenas eram considerados bárbaros, incapazes e necessitavam de medidas protecionistas para integrá-los à civilização 7 . Por meio das novas normativas, cabe ao Estado a demarcação das terras indígenas, assegurando-lhes a posse e autonomia, abolindo, assim, a condição de tutela. Desde a conquista pela colonização portuguesa até os dias atuais, o processo de espoliação das terras e dos direitos indígenas é constitutivo da história agrária do país.

Nos limites deste artigo, elegemos um episódio exemplar da acumulação primitiva, o cercamento das terras indígenas, entre 1910 a 1967, período de vigência do SPI (Serviço de Proteção ao Índio). Portanto, um período republicano, marcado por formas de governo democrática e ditatorial 8

As considerações seguintes são referentes ao de- nominado Relatório Figueiredo. Tal relatório foi “redescoberto” durante as pesquisas da Comissão Nacional da Verdade (CNV), criada no governo da presidenta Dilma Rousseff em 18/11/2011, pela Lei N. 12528/2011. Essa Comissão tinha como principal objetivo investigar as violações dos direitos humanos ocorridos no período entre 1946 -1988, pelo Estado brasileiro. Levando-se em conta as reivindicações das populações indígenas para que os temas rela- cionados à violência contra elas fossem incorporados às investigações, foi produzido o relatório Violações de direitos humanos dos Povos Indígenas, pelo qual o Estado brasileiro reconhecia os crimes e as violações cometidos não apenas durante o período da ditadura militar, como também durante todo o período republicano. As investigações apuraram que mais de 8.500 indígenas foram mortos por ações violentas promovidas direta ou indiretamente pelo Estado entre 1946 -1988 (Araújo 2018; Guimarães 2015). A violência ocorria por meio da invasão de terras, assassinatos, deslocamentos forçados, torturas e expansão de epidemias (CNV 2014).

Diante de muitas denúncias de violência contra os indígenas, advindas de vários países e também internamente, em 1967, durante a ditadura militar, foi criada a Comissão de Inquérito do Ministério do Interior, presidida pelo procurador, Jáder Figueiredo Correia, para averiguar tais crimes 9 . O relatório era de caráter administrativo, pois seu conteúdo vi- sava relatar os crimes cometidos pelos funcionários do SPI. Os principais crimes cometidos foram, segundo o procurador Figueiredo: espancamentos, crucificação, venda de mulheres e crianças, prostituição de índias, escravização, tomada das terras, prisões em cárceres privados, propagação de epidemias, venda do gado, venda de madeiras, exploração de minérios, doação criminosa de terras, venda de produtos de artesanato indígena, massacres, sevícias, além da tortura no tronco 10.

O tronco era, todavia, o mais encontradiço de todos os castigos (...). Consistia na trituração do tornozelo da vítima, colocado entre duas estacas enterradas juntas em ângulo agudo. As extremi- dades, ligadas por roldanas, eram aproximadas lenta e continuamente (p.3). (...) O trabalho escravo não era a única forma de exploração. Muito adotada também era a usurpação do produto do trabalho. Os roçados laboriosamente cultivados eram sumariamente arrebatados do miserável sem pagamento de indenização ou satisfação prestada (p.3).

O SPI abrangia 130 postos indígenas, espalhados em 18 estados do país. Segundo o relatório Figueiredo, muitos inquéritos de denúncias foram abertos, sem resultar em qualquer punição aos culpados. Dentre as chacinas, é mencionada a que ocorreu no Maranhão, onde fazendeiros liquidaram toda uma nação indígena. Em Itabuna na Bahia, foi também extinta uma tribo.

Em Mato Grosso, os Cintas-Largas foram massacrados11 , devido a cargas de dinamites lançados por aviões, além da estricnina adicionada ao açúcar, enquanto os mateiros os caçam a tiros de pi-ri-pi-pi (metralhadora) e racham vivos, a facão, do púbis para a cabeça, o sobrevivente !!! (sic) (...) A falta de assistência, porém, é a mais eficiente maneira de praticar o assassinato. A fome, a peste e os maus tratos estão abatendo povos valentes e fortes. São miseráveis as condições atuais dos Pacás Novos, enquanto os orgulhosos Xavantes resumem-se a uma sombra do que foram até a sua pacificação (p.7). (...) Em Guarita (IR-7- RS), seguindo uma família que se escondia, fomos encontrar duas criancinhas sob uma moita tendo as cabecinhas quase completamente apodrecidas de horrorosos tumo- res provocados pelo berne, parasita bovino (p. 8). (...) Em Nonai, também na Jurisdição IR-7, encontramos uma “enfermaria” - antro abjeto e sórdido – ocupado conjuntamente por cães, porcos e um doente no mesmo quarto infecto. Ainda ali, encontramos um índio preso, cujo dorso riscado de muitas cicatrizes longas, indicava serem resultado de chicotadas (p.8).

Sobre a expropriação das terras, há ainda os relatos sobre aos Nabileque, em Mato Grosso, cujas terras foram apossadas por fazendeiros; os Kadieus (antigos Guaiacurús), donos das ricas terras, doadas por D. Pedro II, em razão de sua valiosa ajuda na guerra do Paraguai, foram banidos de suas terras, além do gado ser vendido pelos fazendeiros e suas mulheres prostituídas. O mesmo ocorreu em Roraima (p.9).

O relatório Figueiredo possui mais de seis mil páginas em 20 volumes. O extenso documento, baseado nos relatos e nas provas encontradas, revelam a peculiaridade do processo de espoliação dos povos indígenas brasileiros por agentes do governo subornados por grandes fazendeiros, garimpeiros e madeireiros. A síntese do documento ao qual tivemos acesso (nota 9) revela os nomes dos funcionários criminosos, bem como seus respectivos crimes, cometidos não apenas contra o patrimônio (terras, gado, madeira, minérios, tachos de cobre) como a violência imposta aos homens, mulheres, crianças. A crueza das cenas de tortura chama a atenção do procurador ao se referir ao processo de desumanização do índio imposto pelos corruptos e corruptores.

No final do capítulo de O Capital sobre a Acumulação Primitiva, Marx afirma que o capital veio ao mundo suando sangue por todos os poros, após ter descrito sobre o processo de violência ocorrido na Inglaterra e também na África e no continente americano em função da colonização e escravização. Como foi dito acima, esse processo acompanha a história do capital em diferentes partes do mundo hoje, segundo vários estudiosos, dentre eles, (Harvey 2010; Sassen 2015). Ainda que haja a universalidade de tal processo, as particularidades do caso brasileiro acima relatado merecem algumas considerações. Tanto no Brasil como nos demais países da América, a colonização implicou num verdadeiro genocídio dos povos indígenas. Segundo autores póscoloniais, o estado espanhol dizimou mais de 70 milhões de pessoas, nos primeiros 50 anos da conquista, sem contar os brasileiros (Dussel 1993). Os indígenas, assim como os africanos (escravizados) foram e, ainda continuam sendo as principais vítimas de toda sorte de violência.

As representações sobre esses dois grupos sociais eram centradas na negação do humano. Eles eram vistos não somente como bárbaros, incivilizados, como também como não humanos, não dotados de inteligência e sentimentos (Antonil 1982; Dimas 1992; Silva 2018). E mais ainda. Eram representados como seres demoníacos, agentes do mal 12 . Esse imaginário atravessou os séculos. Ele não se desfez ao longo do tempo. O relatório Figueiredo é revelador desse aspecto. O índio é visto como empecilho, como o outro, como vagabundo, sinônimo de atraso e não do progresso.

A expansão capitalista no território brasileiro se fez, e ainda se faz, por meio da violência contra esses povos e os camponeses, descendentes de negros e índios, nas várias regiões do país, dentre elas, o Vale do Jequitinhonha e Alagoas, como veremos mais adiante. No que tange ao momento atual, a ideologia do agronegócio camufla o processo de espoliação das terras indígenas ou de camponeses por meio da concepção de que se tratam de terras devolutas (pertencentes ao Estado) e terras vazias, isto é, sem pessoas. Portanto, há a negação da presença dessas populações, assegurada também pelo Estado por meio da produção de normativas legais justificadoras dos interesses de grandes empresas nacionais e internacionais 13 .

O processo de acumulação primitiva se faz após a limpeza do terreno, ou seja, após a retirada das pessoas, por meio da violência, ou de seu extermínio, e do fogo na vegetação nativa, incluindo florestas. A queima da vegetação nativa cede espaço às pastagens para a pecuária, a soja e a apropriação dos recursos minerais. Com isso, os capitais do agronegócio aumentam os lucros se apropriando da renda da terra e eliminando todos os empecilhos (pessoas e natureza).

Os métodos adotados, historicamente, revelam o genocídio lento das populações indígenas, bem como sua resistência. No livro, Utopia, T. Morus revela que as ovelhas na Ingla- terra seiscentista ocupavam as terras dos camponeses pelo cercamento. A peculiaridade histórica do caso brasileiro é que além do cercamento das terras e seus recursos, o processo de extermínio constitui-se na sua principal estratégia, dado que os capitais não necessitam da força de trabalho do indígena, ao contrário do caso inglês, que impelia os expropriados da terra ao trabalho assalariado ou escravo nas manufaturas nascentes. Portanto, no Brasil, a limpeza do terreno corresponde à eliminação da natureza (terra, animais, vegetação) e dos corpos que aí vivem 14 . Talvez seja esse o significado da desumanização do índio, nas palavras do procurador Figueiredo, pela qual, a subjetividade era negada, portanto, passível de ser exterminada. Assim, a cerca ia se movendo para outros espaços, de forma lenta e invisível para a grande maioria da sociedade. Nos dias atuais, a velocidade da cerca ainda é mais rápida, segundo notícias que nos chegam das queimadas na região amazônica 15

Segunda imagem. A cerca nas chapadas. A terra que foi Deus quem fez

Por meio de pesquisa desenvolvida nos finais da década de 1980 16 , foi possível acompanhar a tomada das terras de camponeses do Vale do Jequitinhonha (norte de Minas Gerais). O principal objetivo era, então, analisar o lugar de origem da grande maioria de trabalhadores assalariados nas usinas de cana de açúcar do estado de São Paulo. Essa região era considerada uma das mais pobres do país. Uma das primeiras constatações foi a de que os assala- riados eram camponeses pobres que migravam temporariamente para o trabalho nas usinas de São Paulo, durante a colheita, regressando, em seguida, para seu lugar, sua terra. Viviam em pequenas glebas, denominadas veredas, correspondentes às partes baixas, próximas às nascentes de água. A migração permanentemente temporária, como viemos a definila, ocorria porque os camponeses não conseguiam se reproduzir socialmente nas veredas. Essa situação de vulnerabilidade social ocorreu, sobretudo, após a expropriação das chapadas (parte altas) por grandes empresas reflorestadoras (eucalipto), a partir da década de 1970, com apoio do Estado ditatorial, por meio de legislações que transformaram as chapadas em terras devolutas (Silva 1999).

A segunda constatação empírica importante foi que as chapadas, a terra que foi Deus quem fez, segundo os camponeses, eram terras comuns e se situavam nas áreas mais altas. Ali, os rebanhos pastoreavam e eram extraídos frutos, raízes e folhas de árvores que complementavam as necessidades de reprodução social. Um dos frutos importantes era o pequi, do qual se produzia o óleo para a alimentação. As raízes serviam como remédios; as folhas das árvores eram, após a fermentação, utilizadas para colorir os tecidos produzidos por artesãs. Ademais, havia a produção de algodão que era fiado e tecido pelas mulheres e, em seguida, coloridos. Outra produção artesanal importante era a de objetos de argila, cuja estética e valor artístico são muito valorizados nas localidades e também em muitas cidades da região e, até mesmo, em países estrangeiros. Enfim, as chapadas e veredas (áreas nas regiões baixas, próximas às nascentes e córregos) constituíam num espaço de vida dos camponeses. Espaço de sociabilidade e de produção da vida material e imaterial, por meio do trabalho de homens e mulheres, fincado na natureza em conjunção com a cultura, tradição, saberes, experiência e memória. A população é, na sua grande maioria, negra e quilombola (Macedo 2019; Silva 1998).

A tomada das chapadas implicou na fratura da reprodução social, além de causar maior empobrecimento aos camponeses. O eucalipto, planta das grandes empresas reflorestadoras, tem aumentado consideravelmente sua área, atingindo em 2015, 200 mil hectares, sendo que em 2007 eram 152 mil hectares nessa região. O Estado, por meio de incentivos fiscais, continua apoiando essa cultura, cujos produtos são resinas, extraídas das folhas, e carvão, após a queima da madeira, para alimentar as siderúrgicas do Vale do Aço em Minas Gerais. Ademais, tem avançado sobre as terras dos camponeses, provocando vários conflitos e contribuído para agravar a falta de água, aumentando os períodos de seca. Há estudos que apontam para a desertificação da região, em virtude da cultura do eucalipto consumir muita água e diminuir o volume dos lençóis freáticos 17

Durante mais de três décadas acompanhamos o vaivém de milhares de camponeses negros para o trabalho nos campos de cana de açúcar, café e laranja no estado de São Paulo. A chegada da cerca nas chapadas ocasionou a emigração de mais de 200 mil pessoas daquela região no período de 1970-1990 (Silva 1999). Uma verdadeira diáspora. Parte desse contingente se dirigiu às cidades da região onde se ocupou em trabalhos não qualificados; outros se fixaram nas cidades canavieiras do estado de São Paulo; a maioria se constituiu em temporários, safristas na agricultura paulista, onde foram submetidos ao processo de superexploração por meio da mecanização de seus corpos, como será mostrado mais adiante.

Atualmente, ademais do eucalipto, há no Vale do Jequitinhonha, a exploração de minérios lítio, ferro, granito, pedras coradas e, em menor escala, ouro e diamante. São grandes empresas mineradoras que dominam a extração desses minérios. A espoliação dos recursos naturais (terra, água e minérios), que, na verdade, são bens comuns, impede que os camponeses assegurem sua reprodução social. Desta sorte, o território camponês dessa região é cada vez mais cercado pelo agronegócio, na medida em que novas jazidas de minérios são descobertas, como foi o caso do lítio em 2014.

Terceira imagem. A cerca, “os da rua” e a “má alegria” na região dos tabuleiros de Alagoas

A paisagem entouceirada, quase um completo continuum de cana de açúcar, parece por demais evidentes para qualquer passante que transita pelas estradas planas que cortam os tabuleiros 18 alagoanos. Os canaviais não têm cerca. E por que teriam? Seus limites são os acostamentos da rodovia, uma curva de rio, a saliva salobra das lagoas, o hálito seco do Agreste 19 ; sem pudor, adentram até mesmo bocas de grota e chegam a lamber a beira da pista do aeroporto da capital, de nome Zumbi dos Palmares. Não são os canaviais que estão cercados, mas é a maioria das cidades do leste alagoano que está cercada por eles. Ainda que seja uma cerca feita de nós, caules e de palhas verdes, ela está ali. E tem mais força do que se fosse de estacas e arames farpados. Como argutamente apontou o escritor David Foster Wallace, “as realidades mais óbvias, ubíquas e importantes são frequentemente as mais difíceis de se ver e discutir” (Wallace 2005, 1). Por debaixo da calejada terra dos canaviais, existe um mundo e é um mundo invisível que se articula com o visível.

Durante nossas andanças de pesquisa pelas cidades arrodeadas dessas plantações ensimesmadas, conversamos com muitos trabalhadores canavieiros. Nesses encontros foi comum ouvir o termo “os da rua” como denominação para se referir aos habitantes das cidades. Provavelmente, o significado dessa expressão esteja na trajetória de vida de muitos desses cortadores de cana: que os leva a cultivar ainda hoje o imaginário da morada como lugar ligado à terra. Durante entrevista com um cabo (fiscal) de uma usina alagoana, ouvimos o seguinte comentário:

“Às vezes começa a chover e eles [os trabalhadores do corte da cana] me dizem: ´Que cheiro de terra molhada e eu sem poder plantar’ Lamentam... Eles têm vontade de plantar, mas não têm aonde”. O “cheiro da terra” ativa as lembranças de um passado recente, de uma estação anterior à expulsão das fazendas, destruição dos roçados e expropriação das terras altas e planas dos tabuleiros 20 . Um tempo aparentemente desfeito pela monotonia do en raizamento abusivo da cana de açúcar, mas que ainda está vivo no subterrâneo da memória oral e dos sentimentos.

Jorge, um jovem trabalhador canavieiro que viveu a infância no campo, disse-nos o seguinte:

É muito diferente morar na cidade, quem mora na cidade é a mesma coisa de um passarinho dentro de uma gaiola, porque não tem para onde correr, é viver do jeito que Deus quer. Tudo que a gente come e que a gente bebe na cidade é comprado, se não tiver o dinheiro ele nem come e nem bebe. [...] Hoje até para pisar no chão tem que pagar, se cuspir no chão tem que pagar. Hoje em dia se uma pessoa dissesse que me daria uma casa para morar em uma fazenda com tantas tarefas de terra para morar e plantar, eu daria graças a Deus!

A fala de Jorge revela a cidade como gaiola de arames invisíveis. Arames expressos no modo de vida amplamente regido pelo dinheiro, que vai da caixa de fósforo ao “cuspe no chão”. Como bem disse o jagunço de Augusto Matraga, “o sol de cima é o dinheiro!” (Rosa 2001, 349), e na cidade esse sol se apresenta sem a sombra dos roçados, do pomar, das grandes árvores frutíferas e da criação sombras de outrora. O dinheiro se apresenta como um sol sem nuvens, como mediador universal. Tem que pagar até para “pisar no chão”, pois o chão, a terra, virou mercadoria por todos os lados.

Nem sempre foi assim. Houve época em que o trabalho não era exclusivamente sinônimo de tempo morto, enclausurado pelo dinheiro. Noutrora, quando havia algum acesso à terra (mesmo que deveras limitado e sem o título de propriedade), existia também trabalho para si, voltado para o valor de uso: abrindo uma capoeira, cultivando roça, criando pequenos animais. Nem só de dinheiro viviam os homens e mulheres que labutavam nos eitos de cana. A casa de farinha, hoje cada vez mais difícil de encontrar, é um símbolo desse tempo. As palavras de Jorge tocam ainda no terreno do indizível, de algo sombrio guardado bem no fundo de muitos camponeses e ex-moradores que foram desterrados. É o que uma das depoentes de Bosi (2003, 177) definiu como “medo maior de todos”: o medo de passar fome. Acostumados a plantar para comer, ao não ver um mísero pedaço de chão, sem terra alguma, eles se preocupam: “Como é que vou comer?”. Na cidade, comer e beber não passa mais pelas nascentes, matas, por algo “que a terra deu, dá e cria” 21 . Agora, caminha pelos boletos bancários e vai até o alcance dos holerites.

Existem ainda outros elementos ocultos na condição de quem é amputado da terra; é fome que não se mede com quilos de farinha, é sede que não se mata com talagadas d’água. A vontade incontrolável de plantar ao sentir o cheiro da terra tocada pelos pingos de chuva, para além da lembrança, transborda o anseio daquilo que Weil (1979) chamou de enraizamento: desejo de fazer com que das raízes arrancadas, a contragosto, brote a conservação viva de certos tesouros do passado campesino e certos pressentimentos de futuro. Um futuro em que a terra, como bem falou o Mestre Verdelinho (2006), “acabe com toda a má alegria”.

A “má alegria” de hoje está no ar lânguido das “pontas de rua”, nas esquinas tão incertas e impessoais da vida de agora. Todavia, não significa que no passado de camponês ou de morador de fazenda a vida fosse só de “boa alegria”. Claro que também tinha suas agruras – como bem demonstrou Albuquerque (2009) –, e algumas delas ainda permanecem (Vale 1963).

Apesar da permanência de antigos “desacertos”, a exemplo das fraudes na pesagem da cana cortada (que rebaixam ainda mais o salário que é determinado por produção), no presente existe uma “má alegria” profunda que é de natureza muito distinta, e que está diretamente relacionada ao desenraizamento na cidade.

Certa feita, dentro do ônibus, ouvimos a conversa de dois sujeitos das “pontas de rua” do município de Teotônio Vilela/AL. Bisbilhotamos de canto de olho e de ouvido. Guardamos de cor o que um deles falou, como se fosse a imagem de um arrebol: “Não sei o que o homem foi fazer na lua. Lá não se planta feijão, milho e nem macaxeira. Não se planta nada. Foi fazer o que lá?! Eu não entendo!”

Essa conversa, aparentemente banal, traz algo revelador, pois, se trocarmos a palavra “lua” por “rua”, encontraremos o retrato do que é o desenraizamento camponês: na cidade, é mesmo que estar fora da terra, flutuando sem rumo e sem um centro de gravidade, num espaço que lhe é alheio. E lá, da imensidão fria, ele olha para o brilho das estrelas, com a esperança de retorno para a terra, para o lugar de onde partiu e se sente parte.

Metáforas desse tipo têm o poder de revelar uma dimensão invisível, que muitas vezes está encoberta pela obviedade excessiva do generalizado processo de expropriação da terra. Com a metáfora do desenraizamento, Weil rememora algo que muitos já sabiam, mas não lembravam que sabiam afinal, a necessidade de enraizamento é viva e pulsante, é intrínseca às mulheres, homens e crianças.

Muitos dos expropriados da terra (seja dos antigos roçados das fazendas ou dos tabuleiros) não conseguem mais trabalhar sobre o solo que um dia ocuparam. Os que são empregados pelas usinas, a esmagadora maioria formada por homens 22 , foi submetida a exigência de médias mínimas diárias de toneladas de cana – a partir da reestruturação produtiva dos anos 1990. Os movimentos repetitivos, o suor que pinga no solo e que aduba o canavial em troca de 8 reais por tonelada cortada, o paulatino aumento da intensidade do trabalho, fazem com que muitos sejam descartados ainda na flor da idade. As mulheres são, em geral, as responsáveis por cuidar dos maridos estropiados pelo trabalho, as mesmas mulheres que cozinhavam o almoço transportado na marmita e que lavavam as roupas sujas de fuligem no período em que eles eram úteis para as usinas.

Na entressafra a incerteza de emprego faz com que muitos subam nos ônibus que par- tem Alagoas, sobem nos veículos empurrados por uma espécie de mão invisível. Mas nem todos viram “assum preto” 23 nos poleiros do Sudeste ou passarinho aprisionado nas cidades cercadas de cana. O desejo de retorno à terra fez com que parte dos desterrados da cana se organizasse politicamente (Lima 2013). Apesar dos dias de calor e das noites de frio debaixo da lona preta, do estigma, das ameaças, das calúnias, dos jagunços, das ordens judiciais de despejo, das marchas, dos recomeços, da cerca monocromática e sem arames que arvorase por sobre os antigos roçados, a luta por reenraizamento assentou em terras alagoanas 16.142 mil famílias, numa área total de 149.519 mil hectares (Alagoas 2016).

Diante da brutal desigualdade da correlação de forças do conflito agrário, esses números não são pouca coisa. No entanto, é preciso lembrar que, somente entre os anos 1990 e 1995, foram destruídas aproxi- madamente 40 mil casas de moradores das fazendas de cana (Carvalho 2009) e que, em 2006, Alagoas apresentou o pior índice de concentração fundiária entre os estados brasileiros (Alagoas, 2016). Portanto, a esmagadora maioria das famílias expropriadas encontrase atualmente nas “pontas de rua”. Ainda há a óbvia e ululante urgência da realização de uma efetiva reforma agrária, por mais que a mesma se encontre cada vez mais fora das pautas dos governos.

Mas, para além dos dados estatísticos da desigualdade econômica, política e social, há de se levar em consideração outras dimensões da questão agrária. É que a mutação do camponês em proletariado “inserese num processo longo, necessariamente histórico, pleno de meandros e sutilezas nem sempre visíveis e reconhecíveis” (Silva 1990, 6). E é justamente no mundo do nem sempre visível, nas profundezas do ser, que se encontra a necessidade básica do reenraizamento, algo muito pouco compreendido, mas imensamente sentido.

Quarta imagem: Cerca invisível. A mobilidade do corpo-máquina e a volta ao corpo-ser

Como foi dito acima, a expropriação tem sido, historicamente, a marca do aprofundamento do capitalismo no campo. Indígenas, negros, camponeses são expulsos de suas terras por processos violentos – violência física, mas também simbólica. Houve o genocídio de povos indígenas, houve a desapropriação de camponeses, desterrados e convertidos em força de trabalho. Muitos precisaram migrar para obter trabalho – migração permanentemente temporária, como visto no caso do Vale do Jequitinhonha, mas que ocorre também em outros lugares de origem, tais como, Maranhão, Piauí, Bahia e outros.

A migração para o trabalho - especificamente no caso dos camponeses expropriados convertidos em força de trabalho - pode ser compreendida de formas diferentes. Mais do que direito de ir e vir, entendemos esse tipo de migração como um fenômeno produzido socialmente. Sob o sistema capitalista, o sujeito é livre para vender sua força de trabalho aonde lhe convir, numa relação pretensamente igualitária de troca entre comprador e vendedor. Porém, o sujeito é livre também de todo e qualquer meio de reprodução social, livre de tudo que possa fazêlo existir, exceto da força de trabalho (isso é o que lhe sobra). Configurase o que Gaudemar (1977) denomina de mobilidade forçada.

A expropriação retira os meios de sobrevivência. É esse o processo – levado a cabo pela ação do Estado – que faz com que os sujeitos tenham nada mais do que a força de trabalho para vender. A liberdade de ir e vir é orientada pela necessidade básica de existir. Nesse sentido, afirmamos que os trabalhados se movem orientados por uma lógica, a da sobrevivência se vai aonde há trabalho. A mobilidade do trabalho é orientada pela lógica do capital. Há uma relação entre a mobilidade do capital e do trabalho: quando o capital é móvel, o trabalho é fixo; quando o capital é fixo, o trabalho é móvel. No caso dos cultivos agrícolas (capital territorializado), é a força de trabalho que se move. Voltandonos para o caso dos camponeses expropriados, a migração é menos uma opção e mais uma necessidade, pois tiveram retirados de si a terra, meio de sobrevivência. Os trabalhadores dos canaviais paulistas – mineiros, baianos, maranhenses – se movem para buscar trabalho. Mas essa mobilidade é orientada num corredor migratório (Silva 1999), o local de destino é sempre o mesmo. Parte-se do Vale do Jequitinhonha para os canaviais paulistas, ano após ano. Não há liberdade de ir e vir, há uma cerca invisível e móvel. O trajeto é sempre o mesmo, a mobilidade não é livre, mas orientada para um local e fim.

Os cortadores de cana têm seus salários vinculados à produção, um dia de trabalho perdido, significa redução nos ganhos. Os trabalhadores encontramse a milhares de quilômetros de distância da terra natal, o que torna remota a possibilidade de retorno no meio da safra, pois o valor da passagem é alto e o tempo de viagem é longo. Lembramos que cada dia de trabalho perdido significa redução do salário. A cerca que os mantêm na terra que não é da gente, na cidade dos canaviais, é a própria necessidade de existir imposta por um tipo de trabalho superexplorado e um Estado que historicamente agiu para expropriar. É uma cerca invisível.

Os cortadores de cana ficam em torno de nove meses nas cidades canavieiras do Estado de São Paulo e três meses em suas regiões de origem 24 . Têm retirado de si o sentido de vida relacionado ao território de origem e às relações ali existentes mais do que espaço físico, a distância é do espaço simbólico 25 . E mais, deixando para trás os meios de vida, fica para trás também um ser que em simbiose com a natureza se constituiu 26 . As relações, a sociabilidade, a cultura, tudo muda quando os camponeses não estão mais na terra da gente. O capital, portanto, produz o trabalhador. Porém, não é o ser que trabalha, e sim o corpo. O ser tornase um corpo, mecanizado para uma função: força de trabalho. Marx (2010) chama atenção para o estranhamento advindo dessa conversão do ser em força de trabalho. O corpo é dissociado do ser, tornase objeto a ser trocado, entendido como capital que deve ser entregue àquele que pagar o melhor preço (Federici 2004).

Ainda, segundo a autora, propunhase a separação corpo e mente, mas, ainda hoje, é a necessidade de suprir o corpo – alimentação, abrigo, por exemplo – que move os sujeitos a busca de outros meios de subsistência. Contudo, uma vez que a sociabilidade é orientada pela lógica do capital, é o trabalho que aparece como saída. É nesse balanço entre necessidade e controle da vontade que o corpo se converte em força de trabalho. O corpo que necessita ser suprido, o mesmo que foi expropriado dos meios para tal, é regulado para o trabalho. Essa foi a principal tarefa da acumulação primitiva na Europa: a transformação do corpo em máquina. Mas, além disso, não se trata apenas do controle externo dos corpos convertidos em força de trabalho, mas do autocontrole.

Os trabalhadores não são vistos como sujeitos, mas corpos. Corpo-máquina, que desfere 3.498 golpes de facão por dia e realiza 3.080 flexões de coluna para cortar em média 12,9 toneladas de cana (Laat 2010). Corpo-máquina, que extrapola a carga cardiovascular, podendo chegar a 200 batimentos cardíacos por minuto, que caminha até dez quilômetros por dia, para cortar 07 toneladas de cana por dia (Verçoza 2018). Corpo-máquina que pode cortar até 50 toneladas de cana em apenas um dia de trabalho (Silva 2008).

Como se fosse máquina, o uso indiscriminado do corpo-trabalhador traz o desgaste. Em muito casos, o desgaste advindo de apenas cinco, dez, no máximo quinze anos de corte de cana, resulta na perda da capacidade laboral. O corpo, separado do ser, convertido em máquina, é destruído. O ser, que foi cercado de suas relações, de seu espaço e de si mesmo (estranhamento), que foi transformado em corpo-máquina, é descartado. Os cortadores de cana perdem a capacidade laboral, passam a ter sérios problemas de coluna, articulações, respiratórios e cardíacos. Daiane, esposa de um ex-cortador de cana descartado, disse sentir pena do marido, pois este não conseguia realizar atividades simples do dia a dia (carregar um balde, levantar o filho do chão), apesar de ter somente 33 anos de idade.

No Vale do Jequitinhonha, as mulheres dos cortadores de cana são chamadas de viúvas de marido vivo. Isso porque os homens ficam a maior parte do ano fora, deixando-as sozinhas. São elas as responsáveis pelos cuidados com os filhos, roça, casa, subsistência 27 . Os relatos do desgaste emocional causado pela migração dos homens para os canaviais paulistas são muitos. Olga disse: “Era horrível! [pausa] Todas as gravidezes das minhas meninas ele não estava, entendeu? Eu tinha que me virar sozinha...”. Daiane: “(...) é difícil, a gente acabar de casar e o marido ir embora. Não é fácil não. A gente fica com muita… assim, acha ruim né? (...) A gente fica… de a gente não ter felicidade, acaba de casar e o marido vai embora…”. Teresa relata a situação com os filhos: “(...) eu passei muito aperto com os meninos, chorava... a menina mais velha minha, mesmo, que era muito apegada com o pai, era muito sofrimento pra nós.”. Houve, nesses casos, o que Silva (2014) chamou de apropriação do afeto, quando os laços afetivos são retirados dos sujeitos exatamente por esses serem convertidos em mera força de trabalho, labor, corpo-máquina. Podemos observar um padrão patriarcal de organização, em que o homem migra para prover a família, e a mulher permanece, sendo responsável pelo cuidado 28 . Entretanto, quando o homem, cortador de cana, corpo-máquina destruído e descartado, retorna, é a mulher que vai ser a responsável pelo cuidado. Podemos dizer que é pela mão da mulher que o corpo-máquina percorre o caminho de retorno ao corpo-ser. A mulher (esposa ou mãe), que permaneceu cuidando da casa, da roça, das crianças, cercada pelo agronegócio do eucalipto, é sobrecarregada com o cuidado do homem adoecido e descartado. As relações de gênero se reorganizam, apesar de não haver uma inversão nos polos de poder 29

Aquele corpo-máquina não é mais útil para o capital, e justamente por isso pode voltar ao corpo-ser. Como se as cercas invisíveis e móveis se desmanchassem no momento emque o cortador de cana foi descartado. Mas, em sua retomada das relações afetivas e de si, ele permanece cercado, mas com a cerca física, dos eucaliptais no Vale do Jequitinhonha, por exemplo. A cerca muda de forma, tornase invisível, móvel, mas não deixa de ser cerca.

Considerações finais

A proposta deste artigo foi contribuir para o aprofundamento das reflexões sobre o processo de acumulação do capital em algumas regiões do Brasil, em diferentes momentos históricos, a partir de dados de investigação empírica e documental. Nosso intuito foi analisar esse processo utilizando o conceito da acumulação primitiva não apenas em seus desdobramentos econômicos como também sociais e subjetivos. Harvey (2010) sugere o conceito de acumulação por espoliação, segundo as distintas manifestações desse processo nas várias regiões do mundo globalizado. Por outro lado, as reflexões da historiadora italiana, Federici, trazem também novos elementos para o debate, adentrando a esfera reprodutiva e trazendo ao palco as mulheres. Ademais, suas considerações sobre o corpo/máquina, a partir da concepção cartesiana, nos foram essenciais à compreensão da particularidade histórica brasileira, caracterizada pela escravidão de negros africanos, genocídio dos povos indígenas e superexploração de trabalhadores nos domínios do agronegócio canavieiro.

Assim sendo, há a contemporaneidade do cercamento da terra, dos recursos naturais e dos corpos vivenciada pelos camponeses do Brasil. A espoliação das condições objetivas – terra, bens comuns – implica também em espoliação do ser genérico, segundo a concepção marxiana. O território, tal como concebido por Mançano (2007) e outros autores da área da geografia, dentre eles, Costa (2007), é um espaço de disputas e corresponde às relações de poder. Em nossa análise, procuramos entender o território como um processo que, ao espoliar as condições objetivas, espolia as subjetividades ou as elimina física e/ou simbolicamente, segundo as circunstâncias históricas. As quatro imagens revelam a crueza com que esse processo foi e continua sendo a prática dos que dominam o território do agronegócio. E a resistência? E as disputas? Acreditamos que elas se acham entremeadas aos fatos apresentados. Há mais de 500 anos, as populações indígenas resistem aos massacres, genocídios e sofrimentos impensáveis. Os camponeses quilombolas existem a partir de resistência ao longo do período escravagista e também atualmente 30 . Os camponeses expropriados dos tabuleiros e roçados de Alagoas, resistem, por meio de greves nos canaviais, e, sobretudo, conservam um imaginário, calcado na terra, no seu cheiro, quando caem as chuvas. Portanto, o processo de espoliação inclui os sentimentos, atingindo o ser em suas emoções, em suas intimidades. Do mesmo modo, as lutas de camponeses nos canaviais paulistas forammuito frequentes 31 . Lutas pelos direitos trabalhistas e pelos direitos humanos. Lutas para eliminarem as cercas visíveis e invisíveis. Lutas para sobreviverem num país onde, talvez, exista a maldição dos recursos naturais.

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1 No ano de 2017, o país teve uma produção recorde de grãos alcançando 237,6 milhões de toneladas para uma área plantada de 61,0 milhões de hectares. Outro resultado positivo foi o crescimento do PIB agropecuário de 13,0% no ano, enquanto o PIB da economia foi de 1,0%. A área ocupada pela soja em 2018 era de mais de 33 milhões de hectares e a produção foi de 117 milhões de toneladas; o estado de Mato Grosso é o maior produtor com mais de 31 milhões de toneladas; em 2018, a cana-de-açúcar ocupou 9 milhões de hectares e a produção foi mais de 35 milhões de toneladas; o estado de São Paulo produz mais da metade do açúcar do país; quanto à produção de carne bovina, em 2018 foram abatidos no país mais de 38 milhões de animais, dos quais, quase cinco milhões no estado de Mato Grosso; a produção de celulose em 2018 foi projetada para mais de 20 milhões de toneladas. Nos últimos anos, surgiu um novo território das commodities, o denominado MATOPIBA (sigla de partes dos estados do Maranhão, Tocantins Piauí e Bahia). Um território que engloba biomas muito importantes como o Cerrado, a Caatinga e a Amazônia. Neste território em 2018 foram produzidos soja, algodão, arroz e pecuária bovina. (Ministério da Agricultura, pecuária e Abastecimento. Projeções do agronegócio, Brasil 2017/18 a 2027/28). http://www.agricultura.gov.br. Acesso em 01/08/2019. ˆ

2 Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Projeções do agronegócio, Brasil 2017/18 a 2027/28). http://www. agricultura.gov.br. Acesso em 01/08/2019.ˆ

3 http://www.agricultura.gov.br/noticias/em-2017. Acesso em 24 de junho de 2018. ˆ

4 A bibliografia sobre esta temática é significativa. Destacam-se: Martins 1997; Oliveira 1986; Esterci 1987; Barrozo 2007; Velho 1981; Neves e Silva 2008; Heredia 1988, dentre outros.ˆ

5 O conceito de acumulação primitiva é baseado em Marx 1978. Para a redefinição deste conceito, segundo os tempos históricos: Luxemburgo 1976; Harvey 2010; Federici 2004; Sassen 2015.ˆ

6 Em 23 de julho de 2019, foi assassinado o líder indígena do estado do Amapá, Emyrá Wajãpi, supostamente, por garimpeiros ilegais. Essa reserva indígena é rica em ouro, magnésio, ferro e cobre. Além de garimpeiros, essas terras são cobiçadas por pecuaristas e madeireiros.ˆ

7 O Art. 231 Da Constituição de 1988, § 1º , define as terras indígenas: “São terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias à sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições”. Ver a respeito: https://edudeziderio.jusbrasil.com.br/artigos/494664675/os-direi- tos-dos-povos-indigenas-na-constituicao-de-1988. ˆ

8 Entre 1937-45 vigeu o Estado Novo, governo ditatorial de Getúlio Vargas. De 1964-85, vigeu a ditadura militar. O Decreto n. 8072 de 1910 foi responsável pela criação do SPI, que visava dar assistência aos indígenas. A Constituição de 1934 estabelecia os direitos aos indígenas. A Lei N. 5.371 de 1967, extinguiu o SPI e criou a FUNAI (Fundação Nacional do Índio), que reconhecia a permanência dos índios nas terras em que habitavam, além dos deveres do Estado em lhes prestar assistência à saúde, educação e preservar suas culturas.ˆ

9 A documentação, que resultou no chamado relatório Figueiredo, foi encontrada em várias caixas não catalogadas no Museu do Índio em 2012. Essa documentação havia sido dada como perdida, em razão de um incêndio (cujas causas não foram apuradas) ocorrido em 1967 no Ministério da Agricultura, (Guimarães, 2015).ˆ

10 http://www.mpf.mp.br/atuacao-tematica/ccr6/dados-da-atuacao/grupos-de-trabalho/violacao-dos-direitos-dos-po- vos-indigenas-e-registro-militar/docs-1/relatorio-figueiredo/relatorio-figueiredo.pdf. Acesso em 20/10/2018.ˆ

11 Os Cintas-Largas foram dizimados em 1963, portanto, antes do golpe militar em 1964.ˆ

12 As representações demoníacas sobre índios e negros foram construídas pelos colonizadores, Igreja Católica, ciência e artes. Ver a respeito (Federici 2004). Sobre a representação artística ver a pintura a óleo, O Inferno, sobre madeira de carva- lho, criado cerca de 1510 -1515, por pintor português, cuja identidade não se conhece. Foi encontrado somente no ano de 1834 no acervo de São Bento da Saúde. https://pt.wikipedia.org/wiki/Inferno_(MNAA). Acesso em 10/02/2018.ˆ

13 O governo atual de Jair Bolsonaro emitiu a MP (Medida Provisória) N. 886/2019 sobre a transferência da demarcação das terras indígenas, quilombolas e de reforma agrária para o MAPA, privilegiando os grandes proprietários de terra. Esta MP não foi, contudo, aprovada pelo STF (Supremo Tribunal Federal), que manteve a demarcação das terras indígenas pela FUNAI, órgão sob a jurisdição do Ministério da Justiça. ˆ

14 As metas do atual governo têm sido orientadas para a expansão acelerada do capitalismo na Amazônia, seguindo os mesmos métodos do governo anterior, contra a natureza (queimada) e contra os povos originários. “Pesquisadores do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon) concluíram que o desmatamento na Amazônia aumentou 40% nos últimos 12 meses. O desmatamento chegou ao coração da Amazônia: o cinturão verde que atravessa os estados do Acre, norte de Mato Grosso, sul do Amazonas, parte de Rondônia e vai até o oeste do Pará. Foi nessa região, por onde passam três rodovias federais, que se concentrou a maior parte das derrubadas. A destruição foi maior em áreas privadas ou sem destinação, assentamentos e unidades de conservação. Ainda de acordo com o Imazon, 83% das derrubadas se converteram em áreas de pasto e agricultura. O Imazon também alerta para outro tipo de desmatamento, menos visível, mas que vem crescendo na Amazônia: a degradação florestal. Ela é provocada por pequenas queimadas e pela extração seletiva de madeira. Esse estágio, que antecede a destruição total da área, aumentou 220% no mesmo período”. https:// g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2018/08/24/desmatamento-na-amazonia-aumentou-40-nos-ultimos-12-meses- -diz-instituto.ghtml. Acesso em 10/08/2019.ˆ

15 Incêndios se alastram pelas matas do Norte e Centro-Oeste e já podem ser sentidos até no céu de São Paulo. Maior onda de queimadas dos últimos cinco anos afeta a Amazônia, Pantanal e a Tríplice Fronteira. Aliada ao mau tempo, fumaça ajuda a escurecer a capital paulista em plena tarde. https://brasil.elpais.com/brasil/2019/08/19/politi- ca/1566248656_245830.html. Acesso em 19/08/2019. ˆ

16 Pesquisa feita por uma das autoras deste artigo (M. A. M. S.), que resultou no livro, Errantes do fim do século (1999). ˆ

17 Sobre a produção de eucalipto em Minas Gerais e no Vale do Jequitinhonha, ver Leite, Almeida, Silva 2012. Sobre o consumo de água, Walter Viana, técnico da Superintendência de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (SUPRAM) do norte de Minas Gerais afirma que “o eucalipto consome 230 litros de água por metro quadrado a mais que o cerrado, além do rebaixamento do nível freático em meio metro por ano”. blogdobanu.blogspot.com/. Acesso em 10/07/2019.ˆ

18 Os tabuleiros são terras altas e planas. Durante muito tempo foram considerados impróprios para o cultivo de cana de açúcar. Naquele período, muitos camponeses utilizavam os tabuleiros como terras comuns. Entrevistamos um camponês que viveu na área dos tabuleiros de Teotônio Vilela (atualmente repleta de canavial) que afirmou o seguinte: “É porque era muita terra, aí não era comprado, abria-se um rumo aqui e dizia, isso aqui é meu! Na Cachoeira mesmo e em Peri-peri era assim.”ˆ

19 Área entre a Zona da Mata e o Sertão, no Nordeste do Brasil. O Agreste é uma região semiárida.ˆ

20 A modernização e expansão da agroindústria canavieira alagoana engendrou um violento processo de expropriação, sofrido tanto pelos moradores das usinas e das fazendas de cana – que perderam o acesso ao roçado –, quanto pelos posseiros e sitiantes que ocupavam, sobretudo, áreas dos tabuleiros (terra que durante muitos anos foi considerada imprópria para o cultivo da cana). Esse processo se iniciou embrionariamente no final dos anos 1950 e se prolongou até o final dos anos 1980 (Lima 2006). Em estudo realizado no fim da década de 1970 e início dos anos 1980, que incluía pesquisas de campo na área que deu origem ao município de Teotônio Vilela/AL, Heredia (1988) conseguiu reunir diversos depoimentos, além de outras evidências que comprovam que a expansão da cana para os tabuleiros só foi possível por meio da expropriação dos camponeses. Em nossas pesquisas de campo, antigos habitantes de Teotônio Vilela também relataram formas fraudulentas de expropriação das terras dos tabuleiros (Verçoza 2018). ˆ

21 Conforme os versos da bela música do Mestre Verdelinho (2006).ˆ

22 Segundo dados da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS), do total de trabalhadores empregados na cultura da cana-de-açúcar em Alagoas em 2017, apenas 2% eram mulheres.ˆ

23 Pássaro da famosa canção de Luiz Gonzaga, que teve os seus olhos perfurados para “cantar melhor”.ˆ

24 Em alguns casos, os trabalhadores mudavam-se definitivamente para a cidade canavieira em que estivessem trabalhando. Contudo, em 2009 foi assinado o Compromisso Nacional para Aperfeiçoar as Condições de Trabalho na Cana-de-Açúcar, pacto de livre adesão entre usinas, governo federal e representantes dos trabalhadores rurais. Dentre outras coisas, esse acordo estabeleceu que, para garantir a recontratação na safra seguinte, o trabalhador deveria necessariamente retornar à sua região de origem. Portanto, a ida definitiva da família foi inviabilizada.ˆ

25 Os trabalhadores migrantes têm seus mecanismos de resistência a esse processo. Um exemplo é o esforço em reproduzir a culinária da região de origem, cultivam temperos, encomendam farinha, agem para manter o sentido de pertencimento, apesar da distância.ˆ

26 Marx (2010) faz uma profunda discussão sobre a natureza como corpo inorgânico do homem.ˆ

27 Os homens costumam enviar remessas de dinheiro no decorrer da safra aos familiares no local de origem. Contudo, nem sempre esses valores são suficientes para garantir a reprodução daqueles que permaneceram, o que faz com que essas mulheres tenham que se responsabilizar pela subsistência familiar.ˆ

28 O trabalho feminino também é empregado no corte de cana, contudo, com a redução dos postos para o corte manual, as mulheres são excluídas dos canaviais e acabam dedicandose a outras colheitas. No Vale do Jequitinhonha é bastante comum que as mulheres migrem para a colheita de café, atividade que, pela frouxa fiscalização, permite o trabalho familiar (muitas crianças ajudam as mães nos cafezais) e tem uma safra menor que a da cana.ˆ

29 O homem, que antes cumpria o papel de gênero socialmente construído de provedor da família, adoecido, descartado e inviabilizado de trabalhar, vivencia a desconstrução da masculinidade calcada nas ideias de virilidade e força. Às mulheres, resta a intensificação da função de cuidadora; têm que lidar com todo o trabalho emocional resultante dessa atividade do cuidado. Mais dados sobre as relações de gênero e o adoecimento no corte de cana, consultar Reis (2017).ˆ

30 A bibliografia sobre o campesinato quilombola é extensa. Para uma análise da perspectiva da mulher quilombola camponesa, ver (Macedo, 2019; Furtado, 2018).ˆ

31 Ver, dentre outros Menezes, Cover (2015).ˆ

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